quarta-feira, 6 de outubro de 2010

O MESTRE


Fonte: Boxing Magazine
Autor: Michel Alvarenga

O MESTRE QUE ATRAVESSOU GERAÇÕES

É doloroso olhar para o seu presente e ao mesmo tempo olhar para seu passado; mais olhando para os dois vejo que não preciso observar muito para saber qual será seu futuro. Se hoje ele ainda é ouvassionado por tudo que representou e pelo que ainda representa, após sua morte, será realmente imortalizado.
Sempre foi falastrão. Ás vezes chegava a ser chato. Costumava prever rounds mesmo antes da luta, e na maioria das vezes insistia em acertar. Se fosse chamado de "Destruído Dançarino" não seria nenhum exagero. Era notável ver sua silhueta se mover no tablado. Era mágico ver a rápidez com que seus pés se moviam, para frente e para trás. Quando atacado, quase nunca era acertado. Ás vezes tinha a impressão que ele não era um ser humano normal. Hoje essa impressão deixou de existir, pois com o passar dos anos acabei constatando que não era impressão minha, mas realidade.
A facilidade com que movia-se sua cabeça de um lado para outro, enquanto um saraivada de jabs e diretos eram disparados contra ele, me fez ver muitas vezes, que ele parecia intocável. Hoje não só vejo, mais constato isso.
Ousou ser uma pessoa além do seu tempo. E se imortalizou na história da humanidade. Há quem o reverencie como mestre; há quem diga que não passou de um fanfarrão; há quem pregue que ele não era humano, e de todas elas, essa última constatação acho mais plausível.
Plausível porque em sua época, era comum uma pessoa de carne e osso discriminar seu semelhante pelo fato de um ser branco e outro negro; plausível porque viveu numa época onde era "tão respeitado" pela sua cor, e por ela era visto como um ser humano especial, que até fizeram bebedouros exclusivos para as pessoas da mesma cor, pessoas do seu clã. Falei que é plausível porque numa época onde negros eram arrastados pelas ruas, linxados diante de uma sociedade completamente segregada, é inacreditável dizer que tenha saído ileso fisicamente dela, e atravessado os anos, convivendo apenas com um mal, que para ele mais parece uma lembrança do quanto lutou, e do quanto foi vencedor. As seqüelas deixadas são testemunhas do quanto amava o que fazia. Não podia viver sem estar lutando. A luta sempre foi a sua vida; tanto é, que quando foi impedido de lutar, deixou de viver, porém nunca calou-se. Sua inatividade só serviu para que sua sociedade constatasse o que era evidente, que o mundo nunca mais seria o mesmo, e que o esporte do século XX, seria marcado por seus feitos e ideais.
Ele tinha metas e as alcançou; talvez não à sua maneira, mais foi até elas. Lhe tiraram o cinturão de campeão do mundo, lhe tiraram o direito de ter cifras, mais não conseguiram lhe tirar a vontade de ver seus contemporâneos livres da escravidão dos brancos.
Suas batalhas nos ringues simbolizavam o espírito de luta que tinha. Caçaram sua licença por não querer matar inocentes. Nenhum dos vietcongs haviam o chamado de preto, por isso não tinha motivo para matá-los. No seu país era tratado como escória pela supremacia branca, mais não viu motivo para ceifá-los. A licença que caçaram apenas o impediu de lutar nos ringues, mas jamais se opos ou lhe tirou o direito de nocautear uma sociedade que ainda não havia aprendido a ser humano. Talvez o classifique como "Sobrenatural", ao menos para aquela época. O natural era matar, o natural era discriminar; o natural era abrir fazer conchavos com brancos para crescer. Ele não era normal. Era tão anormal sua vida, que ao invés de ser treinado apenas por negros, foi treinado também por um branco. Um branco que sentava ao seu lado na mesa, e que sempre acreditou em seu potencial, e ele se relacionava, e ainda se relaciona como amigo com ele.
Big George não foi o maior adversário que já teve; Frazier não foi o único adversário persistente; Liston caindo diante dele, representava para o próprio Sony, que a segregação estava com seus dias contados.
Quando voltou aos ringues, até brancos reuniram-se para vê-lo. Foram ao Madson Square Gardem, para ver o símbolo, o referencial de uma geração que se recusava a ser vista como escória da sociedade. Foram ao Gardem para ver o homem que lutou e venceu o governo, de uma das maiores potências do mundo.
Em jogo, estava o cinturão. Frazier era um mero coadjuvante, e mesmo após o 12º round, mesmo após a queda, mesmo após a perca do cinturão, ele saiu do Gardem mais ovassionado, que o próprio vencedor.
Atualmente ele deixou de enfrentar lutas. Está aposentado da guerra. Ela deixou seqüelas, mais teve que entender que quem vence a luta, não é quem vai para a guerra com intuito de matar, mais aquele que vai com intuito de mudar as coisas da forma correta.
Para quem quer saber o seu verdadeiro nome, procure na internet por Cassius Clay, então você verá que Clay era escravo, e Muhammad Ali é livre.

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Michel Alvarenga

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